" Sabe Senhor. Ainda não entendi, viemos à praça, pensei ser um passeio, estranhei, ele não tinha esse hábito, mas vim, feliz. Aqui chegando, deu as costas, entrou no carro, e nem disse adeus.
Olhei para os lados... nem sabia o que fazer ainda tentei segui-lo e quase fui atropelado. O que eu teria feito de tão mau?
À noite, quando ele chegava, eu abanava o rabo, feliz, mesmo que ele nunca viesse me ver no quintal. Às vezes eu latia, mas havia estranhos no portão, e não poderia deixá-los entrar sem avisar meu dono.
Quem sabe foi a mando de minha dona, por eu estar lhe dando trabalho. Não foram as crianças: elas me adoravam, e creio que nem sabem o que aconteceu, devem ter-lhes dito que eu fugi.
Como sinto saudades ! Puxavam-me a cauda, às vezes eu ficava uma fera, mas logo éramos amigos novamente.
Estou faminto, só bebo água suja, meus pelos caíram quase todos. Nossa, como estou magro !
Sabe, Pai, aqui neste canto que arrumei para passar a noite, faz muito frio, o chão está molhado. Creio que hoje vou me encontrar aí contigo, no céu. Meu sofrimento vai terminar, e mesmo em espírito, vou ter permissão para ver as crianças. Peço-vos, então, não mais por mim, mas pelos meus irmãozinhos. Mande-lhes pessoas que deles tenham compaixão. Como eu, sozinhos não viverão mas que alguns meses na terra do homem. Amenize-lhes o frio, igual ao que agora eu sinto, com o calor de atos de pessoas abençoadas. Diminua-lhes a fome, tal qual a que sinto, com o alimento do amor que me foi negado. Mate-lhes a sede com a água pura de seus ensinamentos, transmitindo ao homem, elimine a dor das doenças, extirpando a ignorância da Terra. Tire o sofrimento dos que estão sendo sacrificados em rituais, em laboratórios e tudo mais, tirando dos humanos o gosto pelo sangue. Ampare as cachorrinhas prenhas que verão suas crias morrerem de fome, frio e pestes, sem nada poderem fazer. Abrande a tristeza dos que, como eu, abandonados. Entre todos os males, o que mais doeu foi esse.
Receba, Pai, nesta noite gélida a minha alma, pois não será mais meu sofrimento, mas dos que ficarem, e por eles vos peço.
Amém !!! "
Por: Joana D'Arc Rondine.
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